Os momentos mais solenes da vida supõem preparação. Assim acontece com a Igreja e o seu ritmo celebrativo anual. Ora, o ponto mais alto do ano litúrgico, como sabemos, é a Páscoa. Pois bem, para a sua celebração condigna, a Igreja propõe-nos este tempo de «arrumar a casa interior» que é a quaresma. Seguiremos o espírito do nosso plano pastoral e colocaremos os olhos da alma na exemplaridade do profeta Jonas.
Mas, em concreto, como proceder? Também aqui se verifica a frase de Jesus que compara o reino de Deus a “um pai de família que tira do seu tesouro coisas novas e coisas velhas” (Mt 13, 52). E hoje, o alicerce do reino de Deus é a Igreja que não cessa de nos recordar o que vem de sempre e, porventura, fazer novas propostas conformes com as necessidades do momento.
Entre as tradicionais, para a vivência da quaresma, estão a via da interioridade (o relativo silêncio, a oração, a escuta da Palavra de Deus), a via da conversão (a abstinência e o jejum como meios de autodomínio que conduzem ao sacramento da Penitência e este ao da Eucaristia) e a via da fraternidade (contributo penitencial, ou participação ordinária na sustentação da Igreja, e renúncia quaresmal, resultado de um estilo de vida mais sóbrio, traduzido em poupança que se coloca ao serviço dos mais pobres). Estes dois ofertórios costumam juntar-se num único.
Consultados os órgãos de participação, concordou-se dividir o resultado da tal renúncia quaresmal da seguinte forma: cinquenta por cento para o Fundo de Solidariedade social da nossa Diocese e outra metade para ajuda à Venezuela. O nosso Fundo de Solidariedade diocesano tem prestado ajuda a imensas situações graves emergentes ou pedidos de auxilio que nos são reportadas continuamente; quanto à Venezuela, participamos num programa da Caritas local cuja função é localizar e suprir situações de carência alimentar severa ou grave, particularmente entre crianças e grávidas.
Na sua mensagem para esta quaresma, o Papa Francisco acrescenta mais um vetor: o “jardim da comunhão” com a própria natureza, expressão da glória de Deus e casa comum para todos nós. Se não nos responsabilizamos por ela, obscurecemos a nossa relação com Deus, autor de tanta beleza, e prejudicamos gravemente os irmãos, pois a crise ecológica traduz-se em doenças e mortes causadas pela poluição, em desastres naturais, em fome devido à seca ou enxurradas, em pragas que afetam as culturas, etc.
Vivamos, então, esta quaresma como tempo de graça e caminho de felicidade. Seja-me permitido acentuar o recurso ao sacramento da Penitência e a generosidade da renúncia quaresmal.
Que o Senhor nosso Deus volte sobre vós o seu olhar e vos conceda a paz.
Porto, 4 de março de 2019
+ Manuel, Bispo do Porto