Neste mês de fevereiro o bispo do Porto esteve na Guiné-Bissau para oferecer um Jipe e uma ajuda financeira juntamente com quatro sacerdotes da diocese do Porto. Contactou com a realidade eclesial e humana do país tendo sido recebido pelo Presidente da República da Guiné-Bissau. Para o futuro gostaria que os seminaristas do Porto ali fizessem trabalho missionário.
Entrevista conduzida por Rui Saraiva
P: Foi uma viagem missionária à Guiné-Bissau?
R: Particularmente para mim, no sentido em que uma coisa é contactar com uma realidade a partir de um conhecimento científico, um conhecimento teológico, outra coisa é experienciá-la no concreto. E foi de facto num sentido missionário que assumi esta viagem e, de facto, correspondeu àquilo que era uma sensibilização que eu próprio queria fazer, uma experiência, um contacto com a realidade.
P: Como foi o acolhimento dos guineenses?
R: Isso foi a 100%. Quer dos senhores bispos, quer das instituições por onde passei, quer, inclusivamente, o senhor Presidente da República da Guiné-Bissau com quem estive. Foram todos absolutamente excecionais.
P: Como foram estes dias na Guiné-Bissau?
R: Fundamentalmente, eu vi, escutei e recebi informações. Contactei com as pessoas e a partir daí fiquei com a visão de uma Igreja viva, minoritária e depois a nível humano com carência económicas de todo o género. E vi aquilo que, alguém me dizia, com pouco os missionários conseguem fazer muito. É uma realidade absolutamente extraordinária. É um verdadeiro milagre da multiplicação dos pães, aquilo que algumas religiosas fazem com tão poucas possibilidades, mas que, entretanto, conseguem colmatar tantas necessidades principalmente no campo da infância. Estou convencido que o futuro da Guiné vai passar por uma boa formação das crianças e por estruturas de saúde.
P: Algum episódio, alguma história que queira partilhar connosco e que o tenha tocado?
R: Eu escrevi isso e é uma história real: estava com um grupo de noventa e tal crianças e notei que alguém tocava de leve nos meus sapatos. Era um menino que certamente nunca tinha visto uns sapatos e os meus até estavam bem sujos com aquele pó tipicamente guineense e não eram, nem de longe nem de perto, os melhores sapatos que eu tenho. Aquilo impressionou-me porque eu fiz festas na cabeça daquela criança para brincar com ela, mas a grande atração não era a minha brincadeira, a grande atração eram os meus sapatos.
P: Como é que surgiu esta ideia desta doação de um Jipe e de uma quantia substancial à diocese de Bafatá?
R: O Jipe, de alguma maneira, insere-se neste trabalho de sensibilização missionária do senhor padre Almiro Mendes, e não só, também os outros padres que o acompanharam, estão a fazer na nossa diocese do Porto. E a ajuda económica, para além de alguma que se conseguiu recolher à última hora, era aquilo que era devido pelo ofertório quaresmal do ano anterior (2018).
P: E que frutos poderão vir desta proximidade com as dioceses de Bissau e de Bafatá no futuro?
R: Quer um quer o outro dos responsáveis destas dioceses fizeram a proposta de uma espécie de intercâmbio missionário, ou de uma espécie de acordo missionário entre estas realidades da Guiné e do Porto. Por mim a resposta é sim. Estou convencido que somos capazes de ganhar mais do que propriamente o investimento. Por exemplo, no campo da sensibilização dos nossos seminaristas. Embora não pondo isso como obrigatório, mas gostava de criar as condições para que os nossos alunos passassem na Guiné dois, três meses em contacto com aquela realidade. Não turismo, porque ninguém vai para a Guiné fazer turismo, mas de observação e também de “sujar as mãos” na realidade do trabalho com as crianças, com o mundo das religiosas, que são poucas mas estão a fazer um trabalho notabilíssimo. E até com os párocos, ainda que a estrutura de organização não seja igual à nossa, as paróquias são reduzidas, mas têm um trabalho espantoso em todos os âmbitos. Desde a evangelização à promoção humana.
P: Podemos dizer que, em pleno Ano Missionário com o lema pastoral “Todos discípulos missionários”, esta viagem à Guiné teve um sabor especial?
R: Foi aquilo que me levou a ir este ano, mesmo num contexto de falta de tempo, porque é o primeiro ano que estou no Porto. Estou a contactar com muitas estruturas e pessoas que, logicamente, não conhecia e o tempo não é muito. Mas o facto de estarmos em Ano Missionário motivou-me a dizer: tem de ser agora. Fui e só dou por bem empregue esse tempo usado. Para o futuro há que agora amadurecer. Trata-se de uma experiência, embora mínima e pequena, mas há muita gente que conhece bem a realidade guineense e, todos em conjunto, somos capazes de estabelecer critérios de uma atuação para o futuro. Com o tempo. Não é para hoje nem para amanhã, mas com o tempo estabeleceremos umas linhas básicas de uma certa coordenação de atividade missionária com a Guiné-Bissau.
Fonte: Voz Portucalense