O encontro “Construindo Pontes Norte-Sul”, organizado pela Universidade Loyola de Chicago e pela Pontifícia Comissão para a América Latina, com o apoio de outras instituições, foi uma oportunidade para promover a sinodalidade como uma forma colaborativa de enfrentar a injustiça… juntos.
Um momento para fazer bagunça com esperança, com uma esperança que não decepciona e que foi o fio condutor de um encontro histórico, mas que quer ser hábito para o futuro, permitindo um maior diálogo entre os Papas e os estudantes universitários.
O encontro “Construindo Pontes Norte-Sul”, organizado pela Universidade Loyola de Chicago e pela Pontifícia Comissão para a América Latina, com o apoio de outras instituições, foi uma oportunidade para promover a sinodalidade como uma forma colaborativa de enfrentar a injustiça… juntos, e para fazê-lo em um dia, 24 de fevereiro de 2022, quando o mundo olha para a Ucrânia, para quem a oração foi pedida para ajudar a construir pontes para evitar a violência.
Seria impossível resumir em poucas palavras o que foi vivido em “um quadrado virtual que nos faz iguais a todos em quadrinhos”, nas palavras de Emilce Cuda, secretária da Pontifícia Comissão para a América Latina, que definiu este momento como “um gesto sinodal concreto”, que, referindo-se ao Papa, “fala de seu espírito jovem, de sua capacidade de amar e de se apaixonar”. Ela o fez em um primeiro momento de acolhida, que foi precedido pelas palavras de boas-vindas do cardeal Cupich, arcebispo de Chicago, que, afirmando que o Espírito Santo precisa de nós, nos convidou a “não ter medo dos desafios que enfrentamos, das perguntas que são muito difíceis de responder”.
O projeto, do qual participaram 121 estudantes de 21 países e 58 universidades, foi uma oportunidade para todos, mas especialmente para o Papa Francisco, que ao final do encontro garantiu aos estudantes que “o que vocês disseram me fez bem, hoje eu saio um pouco diferente do que entrei, vou ver se consigo mudar um pouco”.
O Papa Francisco começou salientando a importância decisiva da construção de pontes, a ponto de afirmar categoricamente que “um cristão que não sabe como construir pontes esqueceu seu batismo”. Isto se concretiza aprendendo a entender as perguntas, insistindo que “mais do que dar respostas, nos pedem para acolher perguntas com a mente e com o coração, que as perguntas que a vida nos faz, que a cultura nos pede, que os problemas humanos nos pedem, sejam recebidos com a mente e com o coração, e que as respostas também sejam inteligentes, cordiais com o coração e pragmáticas com as mãos”.
Para isso, é preciso respirar esperança, insistiu o Santo Padre, que denunciou o problema da migração como um dos dramas mais sérios, insistindo que os migrantes devem ser acolhidos, acompanhados, promovidos e integrados. Alguém que é filho de migrantes chamou os estudantes universitários para se perguntarem como cuidar dos migrantes, chamando o mundo universitário para cultivar a transdisciplinaridade, também para fazer uma bagunça e ter esperança como âncora.
A partir daí, foi estabelecido um rico diálogo entre os estudantes universitários e um Papa que às vezes era visto como um professor, mas também como um estudante que anotou com atenção o que os 16 estudantes universitários e 4 professores expressaram, que, divididos em 4 grupos, abordaram diferentes questões às quais o Papa respondeu com a sabedoria de um ancião que guia as novas gerações na construção de um futuro melhor.
Cada um dos professores apresentou os alunos, que explicitaram algumas das questões presentes na vida dos migrantes, começando pela falta de oportunidades que eles têm, que geram desafios e criam situações desumanizantes, manifestadas na pobreza extrema, que é também uma das causas da migração, na acumulação de riqueza, algo fortemente denunciado pelos representantes brasileiros em um país onde 20 homens brancos concentram tanta riqueza quanto os 60% mais pobres da população, a mudança climática e o pouco envolvimento dos bispos e do clero estadunidense, com grande desinteresse por estas questões, o que desilude os jovens com a Igreja, como eles próprios denunciaram, pedindo treinamento em espiritualidade e na ética da conversão ecológica, e assumindo a não-violência ativa como um modo de vida.
Os jovens universitários também falaram das dificuldades com a língua por parte dos migrantes, assim como das dificuldades dos pastores e comunidades para serem sinais de hospitalidade, para ouvir e aprender de seu povo o cuidado com os pobres. Pessoas que foram obrigadas a migrar em busca de oportunidades que lhes foram negadas em sua pátria e que desafiam os jovens, como eles mesmos expressaram. “Criar um mundo mais justo do que aquele que encontramos, como dever dos jovens”, procurar economias alternativas e solidárias, espaços de diálogo em busca de políticas públicas.
Tudo isso diante das atitudes dos líderes mundiais, dos quais os universitários dizem que “eles só cuidam de seus próprios interesses, mesmo que isso signifique gerar guerras”. Isto gerou vítimas de um sistema de exclusão, marcado por causas que provocam a migração, como a falta de cuidado com a Casa comum, a violência ou as próprias instituições governamentais. Algo que leva os jovens a pedir “uma Igreja peregrina e não estática” para os migrantes, também nas universidades católicas, chamadas a serem centros de encontro, que ajudam a abrir portas para eles e a superar uma narrativa tóxica em torno dos migrantes, que não devem ser temidos, mas escutados.
O Papa Francisco assumiu o desafio e em suas respostas declarou desde o início que “seria bom se este diálogo entre Papas e estudantes pudesse ser repetido, o Papa precisa de alguém que o faça pensar, algo que os estudantes podem fazer”. Neste sentido, assumindo sua condição de ancião, ele apresentou os idosos como as raízes da sociedade e os jovens como a parte visível da árvore, como os frutos, desafiando os migrantes a não esquecer suas raízes, migrantes que, com suas remessas, sustentam a economia de muitos de seus países de origem.
Um dos desafios, nas palavras do Papa, é “passar da violência e da condenação à construção de atitudes não violentas como uma atitude mais desafiadora para os jovens”. Por isso ele afirmou a necessidade de “a profecia da não-violência”, convidando os estudantes universitários a realizá-la. Uma não-violência que “tem a força da doçura, que é uma das mais belas atitudes humanas, nascida da ternura”, algo que nasce de Deus, que é próximo, misericordioso e terno, ao ponto de que “se alguém pensa em um Deus que não é terno, não é nosso Deus cristão, Deus se apresenta com ternura e compaixão”, nas palavras de Francisco. Para isso, é necessário deixar de lado a hipocrisia e assumir uma “sinceridade que faça você avançar em harmonia com o mundo”.
O Papa disse que a Igreja ainda não assumiu o problema ecológico em sua totalidade, chegando ao ponto de dizer que aqueles que o fazem são vistos como comunistas. Em resposta, ele disse que a mensagem do Evangelho é muito clara a este respeito, chamando os pastores para estarem muito próximos do rebanho e advertindo contra “pastores que não se aproximam, que transformam sua igreja em um refúgio conformista para pessoas incapazes de se comprometerem”.
A maneira de lidar com os migrantes é encontrada em Mateus 25, segundo o Papa, uma atitude mais que necessária em relação aos migrantes, que são estigmatizados, explorados, não pagos com um salário justo, vítimas de desigualdades estruturais, vítimas de violência que assusta e faz com que se seja tentado a “ficar fora do caminho”. É por isso que ele pediu à Igreja que abra seu coração, que não seja estática, que não se defenda atrás de muros, que seja uma Igreja que saia para a rua. Pois “Jesus bate à porta por dentro para que o deixemos sair”.
Tudo isso e muito mais em um encontro que, ao longo de uma hora e quarenta minutos, gerou uma infinidade de perspetivas que exigem uma análise mais detalhada e da qual certamente surgirão muitas reflexões para o futuro. O Papa deu sua bênção final, lembrando seu já famoso “não se esqueçam de rezar por mim”.
Fonte: Vaticano News