Da nossa paróquia e da Afurada foram 4 autocarros, mas mais de 700 pessoas participaram nesta caminhada. Esta jornada começou com uma saudação do Padre Almiro dirigida aos presentes, congregados junto do Santuário de Nossa Senhora da Urtiga, num largo emoldurado por cartazes alusivos à paz. Nas suas palavras fez ver a necessidade de «tecer os caminhos novos do Amor, deixando ódios e violências». Estava dado o mote para o cantor Miguel Bandeirinha galvanizar os caminhantes com o cântico «É preciso renascer, deixai ódios, violências».
Foi assim que se iniciou o momento cultural que precedeu a caminhada, o qual incluiu ainda outras intervenções. A primeira consistiu na leitura de um emocionante texto do Pe Almiro, em que se prestava uma sentida homenagem às crianças que já sucumbiram na sinistra guerra da Ucrânia, lembrando que temos muito presentes todas as outras: “Queridas crianças da Ucrânia em conflito e do mundo em guerra, ficai sabendo que morais no melhor lugar do nosso coração e que todos os que aqui estamos sofremos, quando vemos que o nosso nada, até o desta caminhada da paz, é o tudo que temos para vos dar e para atirar à cara dos senhores feios e polutos que fazem a guerra. Só merecem um nome: Herodes!”. Seguiu-se o lançamento dos balões, com as cores da bandeira da Ucrânia, enquanto um grupo de jovens bailarinas executava um número ballet. Este momento cultural terminou com Isabel Silvestre a cantar a conhecida «Canção de Emigrante», fazendo uma intencional alteração ao texto de Rosália de Castro: «Este parte, aquele parte e todos se vão, Ucrânia ficas sem homens que possam cortar teu pão».
Para dar início à caminhada, formou-se um longo cordão humano, que encheu de movimento e colorido os diferentes caminhos do percurso, sempre orientado por agentes da PSP disponibilizados pela Câmara Municipal de Ourém. Também a Junta de Freguesia de Fátima deu um precioso apoio aos peregrinos, fornecendo-lhes garrafas de água, ao longo do caminho. Esta fantástica colaboração das autoridades civis contrastou com a fria indiferença e distante alheamento dos responsáveis do Santuário de Fátima. Entre os caminhantes seguiam também grupos de ucranianos, que integravam crianças com flores nos seus cabelos. Na Capelinha das Aparições tinham à sua espera um grupo de crianças portuguesas, com a intenção de oferecer a Nossa Senhora tantas flores quantas as crianças mortas na guerra da Ucrânia, mas este gesto não pôde cumprir-se, por restrições do Santuário.
A caminhada teve ainda duas paragens, para os peregrinos se reunirem à volta de uma jovem violinista, que ajudou os presentes à reflexão, com os acordes do Hino da Alegria da nona sinfonia de Beethoven, em cujo texto Schiller expressa uma visão da raça humana como uma única fraternidade. Na segunda pausa, fez-se também a solta de pombas, gesto que estava programada para ser realizado junto da Capelinha das Aparições, à semelhança do que o Papa já fez no Vaticano. Como se sabe, a primeira vez que a pomba aparece na Bíblia é para anunciar o fim do dilúvio (Gen 8, 11).
A jornada terminou com uma pequena celebração, que congregou todos os caminhantes à volta da Capelinha das Aparições, onde já estava um grupo de crianças a empunhar as bandeiras da Ucrânia e da Rússia. Na homilia, o padre Almiro Mendes lembrou que o sofrimento dos inocentes “é uma voz abafada que deveria ter eco, ao longe e ao perto”, mas que vai sendo estrangulada, “nos braços da indiferença” de tantos que tornam surdos os seus ouvidos e insensíveis os corações, sem se preocuparem “com o mar de desespero em que tantos naufragam”. Exortou os presentes a nunca descerem “ao chão ruim e funesto da indiferença”, mostrando que a caminhada pela paz pretendeu ser “um grito contra a indiferença”.
A celebração começou com Miguel Bandeirinha a cantar um hino a Nossa Senhora Rainha da Paz e terminou com Isabel Silvestre a envolver todos os presentes no conhecido cântico mariano, em que se pede a intercessão da «Miraculosa, Rainha do Céu», para que «a guerra se acabe na terra».
Finda a celebração às 13 horas, ficou toda a tarde livre, para permitir o regresso daqueles que queriam celebrar nas suas comunidades cristãs a liturgia da Morte do Senhor.
Foi escolhida data de Sexta-Feira-Santa para esta caminhada, por ser o dia em que celebramos a injusta e desumana condenação de Cristo à morte. Este gesto obrigou ao sacrifício de levantar cedo e a gastos no transporte, numa altura de tantos apertos económicos. Pôde, assim, viver-se um pouquinho do sofrimento daqueles que estão a sofrer ao vivo os horrores da guerra.
Artigo: Dr. Manuel António