Quando comecei a trabalhar como jornalista, o chefe de redação pediu-me para participar numa task-force coordenada pelo grande Fernando Assis Pacheco. A ideia passava por antecipar o que seria o mundo 50 anos depois.
Foi um outro tempo.
Hoje não conseguimos sequer antecipar o que acontecerá daqui a um mês.
Quase tudo se tornou volátil.
A superfície ganhou à profundidade.
O ruído ganhou ao silêncio.
A rapidez ganhou à lentidão.
E os protagonistas passaram a ter uma duração muito mais limitada – na política, na televisão, nas empresas ou nas redações, o tempo do protagonismo diminuiu na maior parte dos casos.
O trabalho deixou de ser para a vida.
E a voragem de novidade passou a limitar a permanência das pessoas nos mesmos lugares – ficamos mais depressa cansados, dependemos de novidades todos os dias.
Quero falar de um homem que nunca foi relevado como mereceria.
Jorge Gabriel prepara-se para comemorar 30 anos de carreira.
Começou por ser jornalista no célebre e polémico “Donos da Bola”.
E tornou-se um dos mais fiáveis apresentadores de entretenimento.
Fez as vezes de João Baião no Big Show Sic.
E depois fez o seu caminho em programas com horários e públicos diversos.
Na RTP substituiu Manuel Luís Goucha no Praça da Alegria, já lá vai muito tempo.
O Jorge Gabriel aparece-nos em casa há trinta anos, não são trinta dias.
Conseguiu resistir ao tempo, ao sacrifício do que não é novidade, à queda de todos os que não trabalham para ser mediáticos, à queda dos que permanentemente desejam estar sempre à tona, sempre a piscarem o olho à audiência, sempre a dar entrevistas e a oferecer provas de vida.
O Jorge não é assim.
Aparece todas as manhãs como se fosse da nossa casa.
Tem o talento da invisibilidade visível; ele está, mas não se impõe, respeita-nos no nosso espaço, o seu tom de voz é o certo, não fala baixo e raramente fala alto.
Sorri mesmo quando se ri.
É inteligente no modo como pergunta. Tem uma curiosidade desprendida, não é excessivamente simpático sem nunca ser altivo, distante ou arrogante.
O Jorge Gabriel é um pouco da família.
Um tio que nos visita todos os dias e que quase parece não nos fazer falta até que nos falta. E quando acontece sentimos o vazio.
São estas as razões para que continue vivo quando tantos e tantas morrem mediaticamente.
Celebro hoje esta presença.
De um homem inteligente e culto que soube adaptar as suas ambições àquilo que o tempo pedia – talvez na sua cabeça tenha ficado aquém do que desejava ou do que o seu talento pedia, mas as coisas são o que são e Jorge Gabriel pragmaticamente decidiu fazer o melhor possível de acordo com aquilo que as circunstâncias lhe impunham.
E ao contrário de muitos que ficaram pelo caminho, ele continua.
Tranquilo, profissional, um porto de abrigo.
Parabéns, Jorge.
A Praça da Alegria é a nossa casa.
Mesmo quando não te visitamos durante algum tempo sabemos que estás lá e que nos abrirás a porta como antes.
Fonte: TSF (Luís Osório)